Realização de propaganda eleitoral na véspera e no dia da eleição – Facebook
Deliberação de 9 de abril de 2014
“1. As redes sociais, em especial o Facebook, são um amplo espaço de troca de informações, um veículo para a rápida difusão de ideias e opiniões.
2. Perante esta realidade, o Facebook, entre outras redes sociais, tem sido largamente utilizado para efeitos de propaganda política e eleitoral, em particular no decurso dos processos eleitorais (pelas candidaturas e pelos cidadãos em geral), o que implica a sua sujeição às normas legais que regulam esses períodos especiais.
3. Assim, no âmbito do direito constitucional eleitoral preside o princípio da liberdade de propaganda, o qual garante a livre divulgação das ideias e opiniões políticas, maxime as destinadas a influir sobre os eleitores e a conquistar o seu voto, designadamente através das Páginas, das Cronologias pessoais e nos Grupos do Facebook.
Porém, este princípio basilar é restringido pelo legislador em determinadas situações, por forma a compatibilizá-lo com outros princípios de igual valor, como por exemplo, o da igualdade de tratamento das candidaturas (que conduz à proibição de recorrer a meios de publicidade comercial para fazer propaganda) e o da livre determinação da vontade do eleitor, exigindo o respeito pela reflexão dos cidadãos e a manutenção de paz social na véspera e no dia da eleição (que fundamenta a proibição de fazer propaganda em véspera e dia da eleição).
4. Ora, no que respeita à proibição de fazer propaganda em véspera e dia da eleição, objeto da presente Informação, interessa referir que, publicamente, é proibido praticar ações ou desenvolver atividades de propaganda eleitoral por qualquer meio nesses dias, pelo que, tratando-se quer de cronologias pessoais quer de páginas do Facebook, elas não podem registar qualquer ação de propaganda praticada após as 00h00 da véspera da eleição.
Ao invés, a atividade desenvolvida até essa hora pode aí permanecer (tal como acontece, por exemplo, com os cartazes afixados na rua).
5. Todavia, nem toda a atividade desenvolvida através do Facebook poderá cair no âmbito daquela proibição se atendermos aos diferentes perfis de utilizador/definições de privacidade, i.e., aos diferentes níveis de acesso à informação disponibilizada pelos utilizadores, o que interessa apurar para efeitos de responsabilização penal de cada utilizador.
Para o efeito, recorreu-se à informação técnica disponível em www.facebook.com (Centro de Ajuda), passando a distinguir-se entre Páginas, Cronologias pessoais e Grupos, com a ressalva, porém, de que a multiplicidade de interação possível no Facebook, a sua crescente dinâmica evolutiva e a especificidade da informação consultada condicionam a análise e reclamaram, em muitas das situações, uma análise casuística, ainda que enquadrada pelas orientações agora formuladas.
5.1. Como nota prévia importa referir algumas características de base:
- Cada pessoa que se regista no Facebook possui uma conta com informações de início de sessão;
- Cada conta pode ter uma Cronologia pessoal, gerir várias Páginas e fazer parte de diversos Grupos;
- No Facebook, as ligações de amigos têm de ser confirmadas pelas duas pessoas envolvidas.
5.2. As “Páginas do Facebook” são, por natureza, espaços públicos e servem para comunicar de forma mais abrangente com as pessoas, porquanto têm um fim comercial/publicitário e representam empresas, organizações, marcas, celebridades, entidades públicas, etc., sendo geridas por administradores (que devem ser os representantes oficiais daquelas entidades).
Assim, criam-se Páginas para partilhar informações sobre produtos, para divulgar projetos ou ideias, para discutir assuntos, etc.
Como principais características, podemos assinalar o seguinte:
- Quanto à “privacidade”, as informações e publicações de uma Página são públicas e geralmente estão disponíveis para todas as pessoas no Facebook;
- Qualquer pessoa pode “gostar” de uma Página para ficar ligada à mesma e receber atualizações no Feed de notícias;
- Não existe limite para o número de pessoas que pode “gostar” de uma Página;
- Os administradores de Páginas podem partilhar publicações no perfil da página;
- As publicações da Página são apresentadas no feed de notícias das pessoas que “gostam” dessa Página e dos seus “amigos”.
Como as Páginas são públicas, as informações que um outro utilizador partilha com uma Página são informações públicas. Isto significa, por exemplo, que ao publicar um comentário numa Página, esse comentário poderá ser utilizado pelo proprietário da Página fora do Facebook e todos poderão vê-lo, ou quando se "gosta" de uma Página, cria-se uma ligação a essa Página e essa ligação é adicionada à cronologia do utilizador.
Em termos gerais, as Páginas do Facebook são parecidas a Cronologias pessoais, mas dispõem de ferramentas únicas para ligar as pessoas.
5.3. Já no que toca às “Cronologias pessoais”, as quais se destinam a uma utilização individual e representam pessoas/indivíduos, cada utilizador, ao definir o seu perfil (definições de privacidade e definições da cronologia e de identificação) decide sobre o modo como vai gerir a informação sobre si, como a partilha com os outros e como se posiciona perante os outros.
Afastado do seu poder de decisão encontra-se, porém, o nome, fotos de perfil e fotos de capa, os quais são públicos (qualquer pessoa pode ver).
Assim, com referência aos diferentes tipos de perfil e no que às cronologias pessoais diz respeito, podemos distinguir, de forma genérica, os seguintes níveis de acesso à informação:
a) Qualquer pessoa, incluindo, as que não estão registadas no Facebook, pode ver ou aceder à informação disponibilizada pelo utilizador – i.e. um acesso público universal;
b) Todas as pessoas registadas no Facebook podem ver ou aceder à informação disponibilizada pelo utilizador – i.e. um acesso público dentro da rede social;
c) A informação fica acessível não só aos “amigos”, mas, também, aos amigos daqueles (“amigos” dos “amigos”) – o que permite, ainda assim, um acesso alargado;
d) A informação é exclusiva à rede de amigos (partilha com todos os amigos) ou apenas a alguns deles (“partilha com …” ou “não partilha com …” ou através da criação de listas) ou a membros de um “grupo” que integre – i.e., um acesso restrito.
É possível, ainda, permitir “seguidores” se o objetivo for partilhar informação com um público mais vasto. Os “seguidores” – qualquer pessoa no Facebook, mesmo não sendo amiga – recebe as atualizações no respetivo feed notícias.
Cada pessoa pode ter um número ilimitado de “seguidores” e pode seguir um máximo de 5000 pessoas.
5.4. Os Grupos, embora não sejam uma categoria ao lado das Páginas e das Cronologias, destacam-se, aqui, por constituírem um espaço de partilha de informação entre pessoas, diferente daqueles.
Os Grupos podem ser criados por qualquer pessoa com conta no Facebook e, quanto à privacidade, existem três opções:
- Grupo aberto;
- Grupo fechado;
- e Grupo secreto.
Em Grupos abertos e fechados, qualquer pessoa pode aderir, desde que que aprovada por um dos membros, ou ser adicionada ou convidada por um membro. Já no Grupo secreto, apenas é possível ser adicionado ou convidado por um membro.
Quanto à privacidade, em Grupos secretos e fechados, as publicações são visíveis apenas para os membros do grupo, enquanto num Grupo aberto qualquer pessoa (mesmo não sendo membro) pode ver as publicações dos membros do grupo.
6. Afigura-se, assim, que o ponto nuclear para efeitos de responsabilização do utilizador deve ser a forma como este se posiciona em termos de privacidade, escolhe com quem partilha a sua informação e determina os termos de acesso à mesma (o que funciona como condição), independentemente da possibilidade que há de a sua informação poder vir a ser encontrada ou acessível a qualquer cidadão.
7. Em face daquela premissa, podemos concluir que todos os perfis e situações acima identificados, com exceção das Cronologias pessoais com partilha apenas para os “amigos” ou “amigos dos amigos” e os grupos fechados e secretos), têm por base uma opção de partilhar informação/conteúdos a uma escala que extravasa a esfera das suas relações pessoais e, por isso, de acesso público (em maior ou menor escala, consoante o perfil escolhido).
A mesma lógica se aplica quanto à decisão que o utilizador tem de tomar sobre quem pode publicar na sua página ou adicionar conteúdo à sua cronologia pessoal.
8. Situação particular, a destacar em ambiente de acesso restrito (Cronologias pessoais com partilha apenas para os “amigos” ou alguns deles), é o facto de, ainda assim, cada utilizador ter acesso a comentários feitos por pessoas que não são “amigas”.
Com efeito, o feed notícias (coluna central da página inicial de cada conta), sendo uma lista em atualização permanente com as histórias (publicações, gostos, partilhas, comentários, etc.) das pessoas “amigas” e das Páginas “seguidas”, inclui, ainda, os comentários, “gostos” e partilha de conteúdos de outros utilizadores que não são “amigos”. Por exemplo, o utilizador A publica um conteúdo e partilha-o apenas com o seus “amigos”. Se um amigo dele, o utilizador B, comentar, partilhar ou “gostar” e definir como público-alvo apenas os seus “amigos”, todos os amigos deste têm acesso à publicação inicial e a toda a atividade relacionada com ela. Assim, no feed notícias do utilizador A (que deu origem à história) irão aparecer comentários e outros conteúdos relacionados com a publicação em causa oriundos de pessoas que não conhece ou de quem não é “amigo”.
Deste modo, mesmo no perfil restrito há acesso a conteúdos publicados por quem não é “amigo”, porém, impedir essa possibilidade implicaria um dever de cuidado que não se afigura ser exigível ao cidadão médio.
Assim sendo, a CNE considera que integra o ilícito de “Propaganda na véspera e no dia da eleição” a atividade de propaganda, praticada em período de reflexão, registada na rede social Facebook em:
- Páginas;
- Grupos abertos;
- e Cronologias pessoais com privacidade definida que extravase a rede de “amigos” e “amigos dos amigos”, i.e. nos seguintes casos:
a) Quando se permite que qualquer pessoa, incluindo, as que não estão registadas no Facebook, possa ver ou aceder à informação disponibilizada pelo utilizador (acesso público universal);
b) Quando se permite que todas as pessoas registadas no Facebook podem ver ou aceder à informação disponibilizada pelo utilizador (acesso público dentro da rede social).
A CNE irá emitir um Comunicado oficial que deve ser amplamente divulgado, designadamente junto das entidades proponentes.".